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A cláusula do pôr-do-sol e os novos rumos dos pactos antenupciais

  • Foto do escritor: Bravo Godoy Perroni Advocacia
    Bravo Godoy Perroni Advocacia
  • 6 de out.
  • 3 min de leitura

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O Projeto de Lei nº 4/2025, em discussão no Senado Federal, pode alterar de forma sensível a maneira como os casais organizam seu patrimônio. O texto propõe atualizar o Código Civil e, embora ainda não tenha sido aprovado, já lança luz sobre uma tendência clara: dar mais autonomia aos cônjuges e reduzir a burocracia que hoje envolve a vida conjugal.


Entre as inovações, destaca-se a inclusão do artigo 1.653-B, que prevê:

“Admite-se convencionar no pacto antenupcial ou convivencial a alteração automática de regime de bens após o transcurso de um período de tempo prefixado, sem efeitos retroativos, ressalvados os direitos de terceiros.”

Na prática, esse dispositivo permite que os noivos ou companheiros combinem, desde o início da união, uma mudança futura do regime de bens. É a chamada “cláusula do pôr-do-sol” (sunset clause), expressão emprestada do direito anglo-saxāo para indicar uma regra que nasce já com prazo de validade ou de transformação.


Do que temos hoje para o que se propõe

O Código Civil em vigor já confere liberdade aos nubentes para escolher o regime de bens, inclusive criando arranjos mistos (art. 1.639). A alteração posterior também é admitida, mas exige autorização judicial, pedido motivado de ambos os cônjuges e sempre com a ressalva de não prejudicar terceiros.


O projeto de lei não revoga essa possibilidade, mas oferece um caminho mais direto: a mudança pré-combinada, vinculada a um critério objetivo: o tempo de duração da união. Em vez de ingressar em juízo anos depois para pedir alteração, o casal pode deixar essa condição já registrada no pacto antenupcial.


Assim, ao invés da adoçāo de um regime misto, passa-se para a adoçāo de um regime concatenado.


Como está atrelada a um critério objetivo fixo, o lapso temporal, essa lógica de transição pode ser lida como uma forma de “amadurecimento patrimonial”, permitindo que o casal comece de maneira mais cautelosa e, com o tempo, abra espaço para a comunhão plena dos esforços.


A título exemplificativo, imagine dois jovens que decidem casar pelo regime da separação convencional de bens. Ambos querem preservar seus patrimônios iniciais e evitar riscos em caso de uma separação precoce. No pacto, porém, estabelecem que, após cinco anos de casamento, o regime passará a ser o da comunhão parcial de bens.


O que acontece na prática? Durante os cinco primeiros anos, cada um é proprietário exclusivo do que adquirir. No sexto ano, a comunhão passa a valer, mas apenas sobre os bens futuros. Os direitos de terceiros continuam resguardados e não há retroatividade: aquilo que foi adquirido no período inicial permanece na esfera individual de cada cônjuge.


Reflexões necessárias

A proposta tem pontos positivos evidentes: valoriza a autonomia privada, simplifica procedimentos e reconhece que as relações conjugais evoluem com o tempo. Por outro lado, não se pode ignorar alguns riscos. A mudança automática pode surpreender os cônjuges se, anos depois, a realidade financeira ou pessoal já não refletir o acordo feito no início. Nessas situações, restará novamente a via judicial para rever o pacto.


Ainda assim, trata-se de um avanço. Ao invés de depender exclusivamente da chancela judicial, o projeto abre espaço para que o pacto antenupcial seja mais do que um documento formal — torne-se um verdadeiro instrumento de planejamento de vida.


Conclusão

O PL 4/2025 ainda está em discussão no Congresso e poderá sofrer alterações. Mas, ao introduzir a cláusula do pôr-do-sol, já sinaliza uma mudança de paradigma: menos tutela estatal e mais confiança na capacidade dos casais de decidir sobre seu próprio futuro.


Se aprovado, será uma ferramenta importante para quem deseja alinhar o regime de bens não apenas ao início da relação, mas também ao caminho que ela percorre. Até lá, continua valendo a regra atual, com a possibilidade de alteração apenas mediante autorização judicial.


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