
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou um importante entendimento sobre sucessões internacionais ao julgar o Recurso Especial (REsp) 2.080.842/SP. A decisão reforça que a Justiça brasileira não tem competência para processar inventários envolvendo bens localizados no exterior, pois a sucessão desses bens deve seguir as leis do país onde estão situados.
O julgamento teve como base o artigo 23, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC), que determina a competência exclusiva da Justiça brasileira para o inventário de bens situados no Brasil. Para bens no exterior, aplica-se o princípio da lex rei sitae, pelo qual a sucessão é regida pela legislação do local onde os bens estão registrados.
O caso analisado pelo STJ envolveu bens mantidos em offshores sediadas nas Ilhas Virgens Britânicas. Os herdeiros pleitearam a inclusão desses bens no inventário brasileiro e sua consideração para efeitos de compensação de legítimas. O STJ, no entanto, decidiu que os bens situados fora do Brasil não podem ser incluídos no inventário processado em território nacional, nem mesmo para fins de equalização da herança.
Principais impactos da decisão
Inventários separados: Quando uma pessoa falece deixando bens no Brasil e no exterior, será necessário abrir inventários distintos em cada país onde houver patrimônio.
Ausência de fiscalização pela Justiça brasileira: Se houver suspeitas sobre bens mantidos no exterior, a Justiça brasileira não tem competência para exigir a listagem desses bens no inventário nacional. O levantamento deve ser realizado conforme os procedimentos do país onde os bens estão localizados.
Inviabilidade da compensação de legítimas: Não é possível compensar valores recebidos por um herdeiro no Brasil com bens situados no exterior. Isso pode gerar impactos na divisão patrimonial entre os herdeiros necessários.
Importância do planejamento sucessório internacional: Como o Brasil não adota o princípio da sucessão universal – que prevê a aplicação de uma única lei para todo o patrimônio do falecido –, a sucessão de bens no exterior será regulada pela legislação estrangeira. Cada jurisdição pode ter regras diferentes sobre herança, impostos e testamentos.
O entendimento do STJ reforça a necessidade de considerar as normas de cada país ao tratar de sucessões que envolvam bens fora do Brasil.
A lei brasileira não tem aplicação em relação à sucessão dos bens no exterior, inclusive para fins de eventual compensação de legítimas.
REsp 2080842 / SP
Cinge-se a controvérsia a discutir a competência para processar inventário de falecido residente no Brasil, mas que possuía bens no exterior.
Nos termos do art. 23, II, do CPC/15, é de competência exclusiva da autoridade brasileira, com exclusão de qualquer outra, em matéria de sucessão hereditária, proceder ao inventário de bens situados no Brasil, ainda que o autor da herança seja de nacionalidade estrangeira ou tenha domicílio fora do território nacional.
A Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (LINDB) elegeu o domicílio como relevante regra de conexão para solver conflitos decorrentes de situações jurídicas relacionadas a mais de um sistema legal (conflitos de leis interespaciais), porquanto consistente na própria sede jurídica do indivíduo.
Assim, a lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o direito ao nome, a capacidade jurídica e dos direitos de família (art. 7º). Por sua vez, a lei do domicílio do autor da herança regulará a correlata sucessão, nos termos do art. 10 da lei sob comento.
Em que pese a prevalência da lei do domicílio do indivíduo para regular as suas relações jurídicas pessoais, conforme preceitua a LINDB, esta regra de conexão não é absoluta.
Consoante a doutrina, outros elementos de conectividade podem, a depender da situação sob análise, revelarem-se preponderantes e, por conseguinte, excepcionar a aludida regra, tais como a situação da coisa, a faculdade concedida à vontade individual na escolha da lei aplicável, quando isto for possível, ou por imposições de ordem pública.
Dessa maneira, em uma interpretação sistemática das disposições contidas na LINDB e no CPC/2015, depreende-se que o legislador inviabilizou a unidade da sucessão, amparada no princípio da universalidade sucessória e determina que a transmissão do conjunto de bens deve ser governada por uma lei única, pois pela lei se transmite uma universalidade, um patrimônio, ou seja, o conjunto de direitos reais e obrigacionais, ativos e passivos pertencentes a uma pessoa.
Diante disso, a jurisprudência do STJ segue a orientação de que o Brasil adota o princípio da pluralidade dos juízos sucessórios, pois, ainda que o art. 10 da LINDB preceitue a prevalência da lei do domicílio do indivíduo para regular as suas relações jurídicas, esta regra não é absoluta, devendo o inventário e a partilha ser processados no lugar da situação dos bens deixados pelo falecido, não podendo o juízo do inventário no Brasil decidir sobre bens sitos no estrangeiro.
O entendimento que tem prevalecido nesta Corte Superior é o de que a lei brasileira não tem aplicação em relação à sucessão dos bens no exterior, inclusive para fins de eventual compensação de legítimas.
Portanto, o ordenamento jurídico pátrio adotou a pluralidade sucessória, a qual prestigia a legislação do local em que situados os bens (lex rei sitae) para regular a sucessão hereditária, impedindo que o Poder Judiciário brasileiro conheça de bens situados no exterior.
Fonte: STJ
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