Para o ministro, a questão envolve, além de aspectos sociais e políticos, a interpretação e aplicação de diversos dispositivos da Constituição.
O ministro do STF Luís Roberto Barroso reconheceu repercussão geral do seguinte tema: saber se os pais podem deixar de vacinar os seus filhos, tendo como fundamento convicções filosóficas, religiosas, morais e existenciais.
O ministro apresentou três argumentos para reconhecer a repercussão geral. Ele considerou o aspecto social, considerando a importância das políticas de vacinação infantil determinadas pelo Ministério da Saúde; o aspecto político, reconhecendo o crescimento do movimento antivacina e o aspecto jurídico, para discutir a aplicação de diversos dispositivos da Constituição sobre o tema.
No caso em tela, o MP entrou com ação contra os pais de um menino em São Paulo para obrigá-los a seguir o calendário de vacinação. Segundo o parquet, o bem da criança deve estar acima da vontade familiar.
O TJ/SP reverteu decisão que negou provimento a ação sob fundamento de que os pais possuem liberdade de decisão. No acórdão, a Corte afirmou que não há base científica para os alegados riscos trazidos pela vacinação infantil. Argumentou, ainda, que os movimentos antivacina trazem grave risco à cobertura imunológica de doenças infecciosas na sociedade.
No STF, os pais alegam que são veganos, que o filho é saudável e acompanhado por médicos. Por isso, não há que se falar em negligência, uma vez que a escolha pela não vacinação é ideológica.
Ao reconhecer repercussão geral, Barroso pontuou que a questão envolve a interpretação e aplicação de diversos dispositivos da Constituição.
"O texto constitucional garante a prioridade absoluta da criança, devendo a sociedade, a família e o Estado garantirem, entre outros direitos, a saúde dos menores (art. 227). Por outro lado, também assegura aos pais o dever de assistir, cuidar e educar os seus filhos, respeitando a liberdade dos genitores na condução da educação (art. 226 e 229), bem como assegurando a sua liberdade de consciência, de crença e de manifestação política, religiosa e moral (art. 5º, VI e VIII, da Constituição). Por fim, o art. 196 da Constituição dispõe que o direito à saúde é garantido por políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças, o que inclui as campanhas de vacinação obrigatória promovidas pelo Poder Público."
Em caso de reconhecimento da repercussão geral da questão constitucional, o agravo será convertido em recurso extraordinário.
Processo: ARE 1.267.879
Debate histórico
A questão da obrigatoriedade de vacinação colocou em posições antagônicos o sanitarista Oswaldo Cruz e a Águia de Haia, Rui Barbosa no século passado.
Em 1904, uma lei tornava obrigatória a vacina contra a varíola. Dentre aqueles que não queriam colocar dentro do corpo o vírus da própria doença, estava Rui Barbosa. Para o estudioso, a vacina não era inofensiva. Pelo contrário, ele considerava “veneno” a introdução de um vírus no corpo “em cuja influência existem os mais bem fundados receios de que seja condutora da moléstia, ou da morte”.
“A lei da vacina obrigatória é uma lei morta. (...) Contrário era e continuo a ser à obrigação legal da vacina. (...) Assim como o direito veda ao poder humano invadir-nos a consciência, assim lhe veda transpor-nos a epiderme.”
A vacina já era fabricada na Europa e o diretor-Geral de Saúde Pública da época, Oswaldo Cruz, tentou implementar a novidade no Brasil. Longe de ser pacífica, a tentativa ficou conhecida como a “Revolta da Vacina”.
Depois da morte de Oswaldo Cruz, em fevereiro de 1917, Rui Barbosa, em discurso proferido no Teatro Municipal, acabou reconhecendo a importância do sanitarista, dando a ele o epíteto de "pasteur dos trópicos".
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